quinta-feira, 16 de abril de 2009

Artigo II - Práticas especiais e interiores

Artigo II - Práticas especiais e interiores para os que querem tornar-se perfeitos

257. Além das práticas exteriores da devoção que vimos referindo, as quais não se deve omitir por negligência ou desprezo, na medida que o estado e as condições de cada um o permitem, acrescentamos algumas práticas interiores assaz santificantes para aqueles chamados pelo Espírito Santo a mais alta perfeição.
Consiste, em quatro palavras, em fazer todas as suas ações por Maria, com Maria, em Maria e para Maria. a fim de fazê-las mais perfeitamente por Jesus, com Jesus, em Jesus e para Jesus.

§ I - Fazer todas as ações por Maria.

258. Primeiro, é preciso fazer todas as ações por Maria, quer dizer, em todas as coisas obedecer à Santíssima Virgem, e em tudo conduzir-se por seu espírito, que é o santo espírito de Deus. São filhos de Deus os que se conduzem pelo espírito de Deus (Rom 8, 14). E os que pautam sua conduta pelo espírito de Maria são filhos de Maria e, por conseguinte, filhos de Deus, como já demonstramos; entre tantos devotos da Santíssima Virgem, só os que se conduzem por ser espírito é que são devotos verdadeiros e fiéis. Disse que o espírito de Maria é o espírito de Deus, porque ela jamais se conduziu por seu próprio espírito, e sempre pelo espírito de Deus, e este de tal modo a dominou que acabou tornando-se seu próprio espírito. Por isto, diz Santo Ambrósio: "Esteja a alma de Maria em cada um para glorificar o Senhos; esteja em cada um o espírito de Maria ara que se regozija em Deus". Quão feliz é uma alma quando, a exemplo do bom jesuíta Rodrigues, falecido em odor de santidade [canonizado por Leão XIII em 15/1/1888], é toda possuída e governada pelo espírito de Maria, que é um espírito suave e forte, zeloso e prudente, humilde e corajoso, puro e fecundo!

259. Para que a alma se deixe conduzir por este espírito de Maria, é mister:
1. Renunciar ao próprio espírito, às próprias luzes e vontades, antes de qualquer coisa: por exemplo, antes da oração, antes de dizer ou ouvir a missa, antes de comungar, etc; pois as trevas de nosso próprio espírito e a malícia de nossa vontade própria, se bem que nos pareçam boas, poriam obstáculo ao santo espírito de Maria;
2. É preciso entregar-se ao espírito de Maria para ser por ele movido e conduzido como ela quiser. Cumpre colocar-se e permanecer entre suas mãos virginais como um instrumento nas mãos dum operário como uma cítara nas mãos dum artista. Cumpre abandonar-se e perder-se nela, como uma pedra que se atira ao mar. E isto se faz simplesmente e num instante, por um só olhar do espírito, um pequeno movimento da vontade, ou verbalmente, dizendo, por exemplo: "Renuncio a mim mesmo, dou-me a vós, minha querida Mãe". E ainda que não sintamos nenhuma doçura sensível neste ato de união, ele não deixa de ser verdadeiro, do mesmo modo que, se disséssemos, com desagrado de Deus: "Dou-me ao demônio", com a mesma sinceridade, embora o disséssemos sem mudança alguma sensível, não pertenceríamos menos verdadeiramente ao demônio.
3. É preciso, de tempo em tempo, durante ação ou depois, renovar o ato de oferecimento e de união, e, quanto mais o fizermos, mais cedo nos santificaremos, e mais cedo chegaremos à união com Jesus Cristo, que segue sempre necessariamente a união com Maria, pois o espírito de Maria é o espírito de Jesus.

§ II - Fazer todas as ações com Maria

260.
2. É mister fazer todas as ações com Maria, isto é, em todas as ações olhar Maria como um modelo acabado de todas as virtudes e perfeições, que o Espírito Santo formou numa pura criatura, e imitá-lo na medida de nossa capacidade. Cumpre, portanto, que, em cada ação, consideremos como Maria a fez ou faria se estivesse em nosso lugar. Devemos, por isso, examinar e meditar as grandes virtudes que ela praticou durante a vida, especialmente: 1. sua fé viva, pela qual creu fiel e constantemente até ao pé da cruz, sobre o Calvário; 2. sua humildade profunda que a levou a esconder-se, a calar-se, a submeter-se a tudo e a colocar-se em último lugar; 3. sua pureza divinal, que jamais teve nem terá semelhante sob o céu, e por fim todas as suas outras virtudes.

Lembrai-vos, repito-o uma segunda vez, de que Maria é o grande e único molde de Deus, próprio para fazer imagens vivas de Deus, com pouca despesa e em pouco tempo; e que uma alma que encontrou este molde, e que nele se perde, fica em breve mudada em Jesus Cristo, aí representado ao natural.

§ III - Fazer todas as ações em Maria

261.
3. É preciso fazer todas as ações em Maria.
Para compreender cabalmente esta prática, é necessário saber que a Santíssima Virgem é o verdadeiro paraíso terrestre do novo Adão, de que o antigo paraíso terrestre é apenas a figura. Há, portanto, neste paraíso terrestre, riquezas, belezas, raridades e doçuras inexplicáveis, que o novo Adão, Jesus Cristo, aí deixou. Neste paraíso ele pôs suas complacências durante nove meses, aí operou suas maravilhas e aí acumulou riquezas com magnificência de um Deus. ESte lugar santíssimo é formado duma terra virgem e imaculada, da qual se formou e nutriu o novo Adão, sem a menor mancha ou nódoa, por operação do Espírito Santo que aí habita. É neste paraiso terrestre que está em verdade a árvore da vida que produziu Jesus Cristo, o fruto de vida; a árvore da ciência do bem e do mal, que deu a luz ao mundo. Há, neste lugar divino, árvores plantadas pela mão de Deus e orvalhadas por sua unção divina, árvores que produziram e produzem, todos os dias, frutos maravilhosos dum sabor divino; há canteiros esmaltados de belas e variagadas flores de virtudes, cujo perfume delicia os próprios anjos. Ostentam-se neste lugar prados verdes de esperança, torres inexpugnáveis e fortes, habitações cheias de encanto e segurança, etc. Ninguém, exceto o Espírito Santo, pode dar a conhecer a verdade oculta sob estas figuras de coisas materiais. Reina neste lugar um ar puro, sem infecção, um ar de pureza, um belo dia sem noite, da humanidade santa; um belo sol sem sombras, da Divindade; uma fornalha ardente e contínua de caridade, na qual todo o ferro que aí se lança fica abrasado e se transforma em ouro; há um rio de humildade que surge da terra, e que, dividindo-se em quatro braços, rega todo este lugar encantado: são as quatro virtudes cardeais.
262. O Espírito Santo, pela boca dos Santos Padres, chama também a Santíssima Virgem: 1. a porta oriental, por onde o sumo sacerdote Jesus Cristo entra e vem ao mundo (Ez 44, 2-3); por ela entrou da primeira vez, e por ela virá da segunda; 2. o santuário da Divindade, o reclinatório da Santíssima Trindade, o trono de Deus, a cidade de Deus, o mundo de Deus. Todos estes diferentes epítetos e louvores são verdadeiros em relação às diversas maravilhas e graças que o Altíssimo realizou em Maria. Oh! que riqueza! que glória! que prazer! que felicidade poder entrar e habitar em Maria, em quem o Altíssimo colocou o trono de sua glória suprema!

263. Mas quão difícil é a pecadores, como somos, alcançar a permissão e a capacidade e a luz para entrar em lugar tão alto e tão santo guardado não por um querubim, como o antigo paraíso terrestre, mas pelo próprio Espírito Santo, que dele se tornou o Senhor absoluto e do qual diz: "Hortus conclusus soror mea sponsa, hortus conclusus, fons signatus" [ És jardim fechado, minha irmã, minha noiva; és jardim fechado, uma fonte lacrada](Cant. 4, 12). Maria é fechada; Maria é selada; os miseráveis filhos de Adão e Eva, expulsos do paraíso terrestre, só têm acesso a este outro paraíso por uma graça especial do Espírito Santo, a qual devem merecer.

264. Depois que, pela fidelidade,obtivemos esta graça insigne, é com complacência que devemos morar no belo interior de Maria, aí repousar em paz, aí seguramente esconder-nos e perder-nos sem reserva, a fim de que neste seio virginal: 1. a alma se alimente do leite de sua graça e de sua misericórdia maternal; 2. aí fique livre de suas perturbações, de seus temores e escrúpulos; 3. aí esteja em segurança, ao abrigo de todos os seus inimigos, o demônio, o mundo e o pecado, que aí não têm jamais entrada; e por isso ela diz que os que operam nela, não pecarão (Ecli 24, 30), isto é, os que, em espírito, habitam a Santíssima Virgem, não cometerão pecado grave; 4. para que a alma fique formada em Jesus Cristo e Jesus Cristo nela; porque o seu seio, como dizem os Santos Padres, é a sala dos sacramentos divinos, onde Jesus Cristo e todos os eleitos se formaram: "Homo et homo natus est in ea. [Todo homem ali nasceu](Sl 86, 5)

§ IV - Fazer todas as ações para Maria

265.
4. É preciso fazer finalmente todas as ações para Maria. Porque, desde que nos entregamos completamente a seu serviço, é justo que façamos tudo para ela, como um criado, um servo, um escravo. Não a tomamos, porém, como fim último de nossos serviços, que é somente Jesus Cristo, mas como fim próximo, intermédio misterioso, e o meio mais fácil de chegar a ele. A exemplo de um bom servo e escravo, é preciso que não fiquemos ociosos, e sim que, apoiados por sua proteção, empreendamos e realizemos grandes coisas para tão augusta Soberana. É preciso devender seus priviégios quando alguém lhos disputar; sustentar sua glória, quando alguém a atacar; atrair todo o mundo, se for possível, ao seu serviço e a esta verdadeira e sólida devoção; falar, clamar contra todos os que abusem de sua devoção para ultrajar seu Filho, e ao mesmo tempo estabelecer esta verdadeira devoção. E como recompensa destes pequenos serviços, não devemos pretender mais que a honra de pertencer a uma Princesa tão amável, e a felicidade de, por meio dela, ficarmos unidos a Jesus Cristo, seu Filho, com um liame indissolúvel no tempo e na eternidade.

GLÓRIA A JESUS EM MARIA!
GLÓRIA A MARIA EM JESUS!
GLÓRIA A DEUS SOMENTE!

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